sábado, 29 de agosto de 2009

Nada a ver com Amsterdã...

Assim que vi o último post publicado, percebi que este blog realmente parece ter despertado em mim uma vocação para a verborragia escrita - o que não é uma coisa evidente para quem me conhece, já que não sou de falar muito (não é?) - e me fez pensar em Proust (não se assuste com a aparente falta de modéstia, porque o que quero dizer não é bem isso...)

Lembro de ouvir sempre comentários de como Proust é difícil de ler por causa das frases longuíssimas, de 30 linhas, de mais de 4 metros de comprimento e outras medidas assustadoras, o que me fez adiar a leitura de seus livros por muito tempo. Acho que eu já tinha passado dos 40 quando li Proust pela primeira vez (completei 44 este mês e a partir de agora já estou oficialmente perdendo as contas). Foi uma grande revelação: as frases inacabáveis não tornavam a leitura mais difícil e sim mais fácil, porque a gente embarca num pensamento e é levado por ele. Pra mim, foi amor à primeira leitura.

Agora, no meu aniversário, uma amiga me deu de presente 'Como Proust pode mudar sua vida', de Alain de Botton, que eu já tinha lido em português, uns dez anos atrás, antes do primeiro contato com Proust, e agora releio, em inglês, de maneira totalmente diferente depois de finalmente saber do que ele está falando.

Não é o melhor livo de De Botton, mas tem boas sacadas e me trouxe uma lembrança ótima, que sempre me faz rir muito: o concurso do Monty Phyton 'All-England Summarize Proust Competition', em que os canditatos tinham que resumir 'Em busca do tempo perdido' em 15 segundos, primeiro em traje de banho e depois em traje de gala.

Um pouco de humor para o final de semana:

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Literatura pra viagem

Viajar de trem faz parte da rotina de muita gente que vive na Holanda. Como o país é muito pequeno, as pessoas não se dão o trabalho de mudar de cidade quando arrumam um emprego ou vão estudar em outro lugar. Simplesmente vão e voltam de trem todos os dias. É o caso do meu namorado, que há mais de 30 anos mora em Amsterdã e há 25 anos trabalha em Utrecht. E agora é o meu caso também, já que desde dezembro do ano passado estou trabalhando na Radio Nederland, que fica em Hilversum - onde aliás, ficam quase todas as rádios e TVs do país.

Hilversum fica a 30 km de Amsterdã, mas meu trem leva cerca de 40 minutos pra chegar lá, porque é um 'pinga-pinga'. Pára em todas as estações do caminho (5 ao todo, sem contar minha estação de saída, nem a de chegada). Há um trem direto, que leva apenas 15 minutos até lá, mas ele sai da Estação Central de Amsterdã, que fica a mais ou menos 20 minutos de onde eu moro, então, acho mais fácil ir de pinga-pinga mesmo, que aqui é chamado de 'stoptrein'.

Para aproveitar o tempo da viagem, tenho sempre um livro na bolsa e estabeleci que estes 80 minutos de trem, de segunda a sexta, são sempre dedicados à leitura. Tem sido ótimo, porque embora eu sempre tenha gostado muito de ler, às vezes passava semanas sem pegar num livro - revistas e jornais acabavam sempre ganhando prioridade.

E eu, naturalmente, não sou a única que lê no trem. Todo mundo lê no trem (exceto os menores de 25, que preferem passar o tempo ouvindo música ou escrevendo - no celular, é claro).

Os holandeses são apaixonados por livros. Todo mundo parece ler muito. Em qualquer aniversário, pelo menos metade dos presentes são livros. Quase todo mundo também parece já ter escrito um livro (!) e eles acham isso muito natural.

Claro que tem muita coisa ruim publicada aqui também e os best sellers são os mesmos que no resto do mundo. Mas a Holanda tem muitos autores interessantes - poucos publicados no Brasil, infelizmente (um projeto pra mim!)*

Talvez pelos holandeses gostarem tanto de livros, a Holanda tem bibliotecas lindas. Não são aqueles prédios antigos, maravilhosos, lindos de olhar, como em outras cidades européias, mas lugares convidativos, agradáveis: bibliotecas que despertam a vontade de ler. Minhas favoritas são a de Maastricht e a Biblioteca Central de Amsterdã, a OBA (Openbare Bibliotheek Amsterdam). Ir até lá é sempre uma festa!

Dos livros que me acompanharam no trem este ano, dois favoritos: 'De ontsproten Picasso', da holandesa Bianca Stigter, e 'El fotógrafo belga', do chileno Ricardo Cuadros.

Por acaso, conheço os dois escritores, mas não é 'nepotismo' com os amigos. Bianca Stigter, aliás, nem é minha amiga - não porque eu não queira, porque ela me parece ser uma mulher muito interessante. Eu a conheci através de uma outra amiga, que era amiga do marido dela, o vídeo-artista e cineasta britânico Steve McQueen ('Hunger'). E ela, Bianca, é crítica de cinema de um jornal importante daqui, o NRC Handelsblad.

Já Ricardo Cuadros é um colega da Radio Nederland e agora também querido amigo. Um escritor maravilhoso que também merecia ser traduzido para o português e outras línguas.

'El fotógrafo belga' é um romance, uma espécie de 'road-book'. Mas o ponto forte do livro não é a história em si, mas sim o personagem central e a qualidade do texto de Ricardo.

Já 'De ontsproten Picasso' é uma reunião de textos curtos, divagações sobre curiosidades, vida e arte feitas por uma mulher erudita e antenada, no melhor sentido destes dois adjetivos. Um livro que me deixou com vontade de escrever também.

* Pra exercitar o projeto de tradução, aqui vai um pequeno texto sobre Amsterdã incluído em 'De ontsproten Picasso' (o título, aliás, significa algo como 'Picasso brotando')

Cidade dupla

Na esquina da Spiegelstraat com o Prinsengracht, em Amsterdã, vende-se frutas, vinhos, delicatessen, café, chá e outros produtos coloniais. Está nas letras bem desenhadas da fachada. Mas na vitrine estão móveis. No número 51 da Spiegelstraat isso acontece de novo. De acordo com a fachada é um açougue. Mas atrás da vidraça há taças de cristal. Carne vira antiguidade, café vira mesa. Os donos não negam o passado de suas lojas. Há padeiros onde antes havia açougueiros. Com as inscrições que não desapareceram, difíceis de serem apagadas simplesmente porque antigamente se usava materiais mais duradouros, surge quase uma cidade dupla. Dentro da cidade há uma outra cidade, de antigas palavras, inscrições, placas, fachadas. Legendas sem foto.



Aqui o escritor belga Tom Lanoye apresenta a OBA. O vídeo é em holandês, mas dá pra ter uma boa idéia de como é a biblioteca só pelas imagens.

domingo, 2 de agosto de 2009

Gay Pride


A Parada do Orgulho Gay é sempre um dos dias mais animados em Amsterdã. Acontece, em geral, no primeiro final de semana de agosto. Ontem, a cidade estava lotada de gente alegre e bonita. Segundo as estimativas, 560 mil pessoas se reuniram ao longo do Prinsengracht - o canal por onde os barcos da parada passam (sim, aqui o desfile é de barcos!).

O número pode não parecer tão grande se comparado aos números de São Paulo ou Rio, mas é bom lembrar que Amsterdã é uma cidade bem menor que as metrópoles brasileiras - não chega a um milhão de habitantes.

Na parada, os barcos são como trios elétricos: cada um com som próprio e, quase sempre, trazendo um bloco com a mesma fantasia. Uma festa tanto para quem participa quanto para quem assiste.

Tentei fotografar, como faço todos os anos, mas cheguei tarde, não consegui um bom lugar e o mar de gente não me permitiu fazer muita coisa... (taí a foto do mar humano pra comprovar). Mas é claro que hoje já tinha um vídeo no You Tube, então está aí também. Veel plezier!